segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Como comer sem ti, sem o piedoso
costume de tuas asas
que refrescam o ar e renovam a luz?
Sem ti, nem pão, nem vinho,
nem a vida, nem a fome, nem a suculenta
cor da manhã
têm nenhum sentido nem para nada servem.
Lá fora está o mar.
Lá fora, no mundo, estás tu.
Comendo tu sem mim:
A tua fome, tua comida, teu vinho e tua manhã.
Eu aqui ante as toalhas opacas
E a bebida amarga,
Ante os pratos sem sabor nem cor.
Eu tento, sim, eu tento, mas, como
comer sem ti, nem para quê...
Tu trouxeste teu perfume ao jardim
e o gosto da vida.
Lá fora estão o mar e o ar.
Dentro eu só, com a mesa posta
que perdeu a tua voz e a tua alegria.

Mia Couto


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