sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Desde a Aurora
Como um sol de polpa escura 
para levar à boca, 
eis as mãos: 
procuram-te desde o chão,
entre os veios do sono 
e da memória procuram-te: 
à vertigem do ar 
abrem as portas:
vai entrar o vento ou o violento 
aroma de uma candeia, 
e subitamente a ferida 
recomeça a sangrar:
é tempo de colher: a noite 
iluminou-se bago a bago: vais surgir 
para beber de um trago 
como um grito contra o muro.
Sou eu, desde a aurora, 
eu — a terra — que te procuro.

Eugénio de Andrade


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